Ingrid Cicca, gerente de sustentabilidade e meio ambiente da Rede D’Or
“Hoje, a maior dificuldade que a gente tem é a mudança climática”, disse Ingrid Cicca, gerente de sustentabilidade e meio ambiente da Rede D’Or, a maior rede privada de hospitais do Brasil. “Justamente porque não somos uma indústria tradicionalmente considerada contaminadora, as pessoas não enxergam ao sector da saúde como um grande poluidor, então muito poucas instituições no Brasil midem suas emissões”, agrega.
De fato, Cicca afirma que os hospitais consomem energia 24 horas no dia e utilizam uma variedade de recursos que contribuem para as emissões de gases de efeito estufa. Por exemplo, o óxido nitroso, um gás que é amplamente utilizado na saúde e tem um potencial de aquecimento global (GWP, pelas suas siglas em inglês) 228 vezes maior que o CO2.
Além disso, a indústria da saúde tem uma extensa rede da cadeia de fornecedores que contribui para suas emissões, como também muita geração de resíduos.
“A Rede D’Or é uma empresa muito grande com capilaridade nacional, mas vemos que muitas vezes o próprio profissional não tem uma compreensão clara do que é o aquecimento global, Por isso, quando falamos de sustentabilidade, a educação, comunicação e engajamento é fundamental”, disse Cicca.
A executiva ressalta que a abordagem para enfrentar os desafios climáticos deve ser integrada à cultura empresarial. Com essa visão integrada, a companhia busca liderar o caminho na adoção de práticas sustentáveis na área da saúde e contribuir para a luta contra as mudanças climáticas.
– Quais são os pilares de sustentabilidade da Rede D’Or e como a integra na sua estratégia de negócios? Li que tinham um planejamento estratégico para 8 anos de 2022 a 2030.
– Nosso planejamento estratégico foi aprovado pelo conselho de administração da empresa, o que representa uma aprovação formal concedida pela alta gestão da D’Or. Um dos pilares que sustentam nosso programa é o modelo de negócio da Rede D’or, que é fortemente pautado na qualidade técnica, segurança do paciente, humanização e rentabilidade.
Além disso, consideramos a criação de valor como parte essencial de nossa abordagem. Não estamos falando apenas para os acionistas, mas sim para todos os stakeholders envolvidos, incluindo fornecedores, público interno, operadoras e pacientes.
O outro pilar é a prevenção e promoção da saúde, que deve ser uma estratégia fundamental para garantir a qualidade de vida das pessoas em nossas comunidades.
Por fim, o último pilar é o uso racional dos recursos naturais. Como uma empresa de saúde, estamos constantemente consumindo recursos, e se não utilizarmos de forma racional, podemos ter um impacto ambiental significativo. Nesse sentido, temos nos concentrado especialmente na gestão da água e energia.
Implementamos um sistema de automação predial para melhorar a eficiência energética da central de água gelada, responsável pelo sistema acondicionado. Isso permite que o gestor de manutenção monitore remotamente os indicadores de temperatura das diferentes áreas e tome decisões mais rápidas.
Quanto ao uso da água, implementamos controles de envasamento e captamos água pluvial para uso em áreas como jardins e resíduos.
– Sobre o engajamento da cadeia de suprimento, como a Rede pode alavancar a mudança nas outras pessoas e empresas?
– Recentemente, realizamos um evento com nossos principais fornecedores para discutir a agenda ESG, mas vale ressaltar que essa reunião não ocorreu de um dia para o outro. Desde 2015, estamos trabalhando nessa agenda, cumprindo com nosso dever de casa, desenvolvendo políticas e estratégias, sentimos que havíamos atingido uma maturidade suficiente para envolver nossos fornecedores. A jornada rumo à sustentabilidade é contínua, não tem um fim definido.
Durante o evento, realizamos uma autoavaliação para entender em que estágio nossos fornecedores estão em relação à agenda de sustentabilidade. Essa avaliação não tem um caráter punitivo, mas sim visa ajudar no desenvolvimento daqueles que não estão alinhados com os padrões que consideramos ideais, para que eles possam crescer junto conosco.
Adotamos vários métodos para nos aproximar dos fornecedores. Por exemplo, estabelecemos uma parceria com fornecedores para implementar sistemas de logística reversa, buscando reduzir o uso de plástico e minimizar resíduos. Os fornecedores são fundamentais, especialmente quando se trata de serviços de saúde, pois não podemos oferecer assistência sem equipamentos, materiais ou medicamentos. Muitas vezes são eles que trazem soluções inovadoras porque muitas vezes nós não temos seus conhecimentos.
– Segundo a investigação do Grupo Mundial da Saúde, as mulheres compreendem 70% da força laboral na saúde, mas somente possuem 25% dos papéis de senioridade. Como é o case no Brasil e quais são as razões segundo sua opinião? E qual é a situação na Rede D’or?
– Na Rede D’Or, 75% dos funcionários são mulheres, e é importante ressaltar que a presença feminina é especialmente significativa em cargos de liderança, como na gerência e supervisão. Essa representatividade é bastante característica do setor de saúde, no qual a força feminina é notável e desempenha um papel fundamental.
– A presença feminina em cargos de liderança foi um trabalho que fizeram na Rede D’Or ou foi um fenômeno natural?
– Foi um trabalho que fizemos na Rede D’Or para promover a diversidade e inclusão. Inicialmente, no conselho de administração da empresa, tínhamos apenas homens ocupando os cargos, mas nenhuma mulher. Hoje já temos uma mulher que assumiu como membro permanente. Avançamos com pequenas conquistas.
Um dos catalisadores para promover a mudança é o relatório anual que produzimos, juntamente com o compromisso contínuo com a transparência. Ao apresentar nossos resultados anuais e constatar a falta de representação feminina em cargos de liderança, nos motiva a buscar avanços significativos em nossa agenda de diversidade.
– Qual foi o processo para a entrada da Rede D’Or no Índice de Sustentabilidade da B3 e o que isso significa para a empresa?
– A inclusão da Rede D’Or no índice foi uma conquista significativa, especialmente considerando que, quando iniciamos esse trabalho em 2015, a empresa ainda não possuía essa maturidade ESG e entrar no índice não foi uma tarefa fácil, pois tivemos que comprovar todas as nossas práticas e superar possíveis pontos desclassificatórios.
A presença da Rede D’Or em um índice tão restrito demonstra a solidez do nosso trabalho e o fato de que estamos trilhando o caminho certo. É importante que as empresas compreendam a importância de internalizar a gestão de ESG. O objetivo não é trabalhar em função de um índice específico, mas sim incorporar o ESG como uma ferramenta para aprimorar a gestão da empresa como um todo. Entrar no índice é um processo natural e uma consequência do trabalho realizado, não um fim em si mesmo.
– Poderia adiantar alguns projetos da rede em termos de sustentabilidade?
– Atualmente, a Rede D’Or está envolvida em diversos projetos relacionados ao social. Temos priorizado projetos que consigam promover a inclusão social, como a nossa parceria com o instituto Proa, por meio da qual conseguimos inserir 900 jovens em situação de vulnerabilidade dentro da Rede 900.
Além disso, a Rede D’Or implementou o projeto Gestão de Emoções para proporcionar assistência aos nossos 71 mil colaboradores, composto por médicos e psicólogos. Nossa atuação no Instituto IDOR, o instituto de pesquisa e ensino, também é parte fundamental da nossa estratégia e fornece a base científica para o desenvolvimento de soluções médicas.
Na questão medioambiental, já temos 20 hospitais com programa de eficiência energética e 33 em fila para implementação. Isso inclui a automação das centrais de água gelada e eficiência hídrica. E, a diferença do que as pessoas pensam, o maior volume de resíduos que o hospital geral não é infectante, mas têm muito potencial de reciclagem. Então desenhamos um programa de gerenciamento focado em reciclagem.
Outra iniciativa é o programa corporativo de gestão de carbono, no qual estamos priorizando o uso de fontes renováveis de energia. Atualmente, temos 41 hospitais no Mercado Livre de Energia, e nossa meta é chegar a 74 utilizando fontes renováveis. Dessa forma, buscamos reduzir nossa pegada ambiental e contribuir para a sustentabilidade do setor de saúde.